domingo, 1 de novembro de 2009

A Linguagem da Política - Inovações lingüísticas no português conteporâneo

Por que a linguagem da Política especificamente? Porque a Política faz parte do nosso cotidiano, penetra em nossos lares pela mídia, é dinâmica, é rica, é renovadora. Uma inovação na linguagem da Política é um eficaz recurso de Comunicação, irradiando-se em ondas por todo o país e penetrando em outros campos do saber.

Quando Fernando Henrique criou fracassomania, o termo se irradiou, em ondas sucessivas, por todo o território brasileiro, e sua aceitação fez gerar o antônimo sucessomania e os respectivos derivados fracassomaníaco e sucessomaníaco.

A Política forma a história do país, cujo principal esporte é o futebol. Assim, o radical –mania se expande à área do futebol, formando, em plena copa de 94, ronaldinhomania.

A adoção de uma inovação política está diretamente relacionada ao prestígio de seu criador. Tivemos um exemplo recente. Quando o ministro Rogério Magri, do governo Collor, criou imexível, apesar da produtividade de prefixo e sufixo, houve uma polêmica nacional. Em 1995, no governo Fernando Henrique, o ministro Adib Jatene criou infritável, usando o mesmo processo, e houve ampla aceitação.

Essa pesquisa iniciou-se em 1994, com material recolhido nos principais jornais e revistas do país: JB, O Globo, Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo, Estado de Minas, Correio Braziliense, Jornal de Brasília, Gazeta do Povo, Zero Hora, A Tarde, A Crítica, Revista Veja, Revista Isto É, Revista Manchete. Essa coleta estendeu-se até o início de 1996. Compreende a era pós-Collor, com Itamar Franco no poder e primeiro ano do governo de Fernando Henrique.

A escolha desse período não foi aleatória. 1994 foi um ano atípico. O Brasil esteve governado por um vice-presidente porque o presidente da República fora afastado por um processo de impeachment. Foi ano eleitoral. Sendo Ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso, criou – se o Plano Real – ou Plano FHC. O Brasil conviveu com duas moedas: o cruzeiro real e o real, além da fase de transição com o indexador URV. 1995 representou a posse de Fernando Henrique Cardoso na Presidência da República e a continuidade do Plano Real, mantendo-se o real como moeda nacional. Foi ano de muitas crises, começando pela do SIVAM e culminando com a da pasta rosa.

A partir da coleta desse material, organizei-o em grupos, por níveis lexicais, locucionais e frasais. Destaquei inovações propriamente ditas, retomada de palavras em sentido político e empréstimos lingüísticos.

Catalogados os termos, dei início à organização dos verbetes, que foram assim constituídos: classe gramatical (de acordo com o contexto); gênero (baseado na classificação de Mattoso Câmara); processo de formação (numa visão sincrônica, estudando-se a produtividade atual de sufixos e prefixos); etimologia (em caso de retomada de palavras); sentido político; conteúdo histórico; e abonação com indicação da fonte.

Muitos foram os termos criados a partir de lexemas antroponímicos: adhemarismo, brizolismo, cardosismo, collorato, collorizar, fernandohenriquismo, lular, malufismo, marcelista, menemizar, quercismo, sarneyzismo, sarneyzista, ulyssista etc.

Siglas e vocábulos acrossêmicos também geram derivados: ciepão, cutista, embrateleca, pefelagem, pefelista, pepebista, petismo, urvirização etc.

Vocábulos de aspecto híbrido são freqüentes, como se pode observar em fumódromo, showmício, SIVAMgate, umbigotropia.. .

Entre as inovações lexicais, destacaram-se substantivos formados, em sua maioria, por processo de derivação. Grande foi a produtividade dos sufixos –ção, –ismo e –ista e dos prefixos anti-, dês– e super-.

Processo comum foi o que se convencionou chamar de “dupla derivação em cadeia”: um verbo gera outro verbo e este novo verbo gera um substantivo. É o que se observa com o verbo fazer, que gera *fazejar, de natureza freqüentativa, que, por sua vez, gera fazejamento. O processo também pode ocorrer de substantivo para verbo, gerando novo substantivo: Fujimori gera * fujimorizar, que gera fujimorização.

Foram registradas inovações de natureza técnica, ao lado de outras de característica popular, algumas, até, jocosas, de cunho metafórico. Umas caem no gosto popular, como acabar em pizza, sendo adotadas pelo sistema; outras refletem o momento histórico e, logo, serão esquecidas e substituídas, como realmário, nome jocoso atribuído à moeda real numa alusão ao craque brasileiro que se destacou na Copa do Mundo de 94. Outras, levando-se em conta o prestígio do criador, irradiam-se por todo o território brasileiro, como foi o caso de fracassomania.

Nícia de Andrade Verdini Clare (UERJ)

http://www.filologia.org.br/ixcnlf/16/02.htm

Nenhum comentário:

Postar um comentário