segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

ESTILÍSTICA: A EXPRESSIVIDADE DA LÍNGUA

1. 1. CONCEITUAÇÃO DA ESTILÍSTICA

Estilística é uma das disciplinas voltadas para os fenômenos da linguagem, tendo por objeto o estilo, que remete a outra embaraçosa e infalível pergunta: o que é estilo?

1.1. VARIEDADE DE CONCEITOS DE ESTILO

· A palavra estilo, que hoje se aplica a tudo que possa apresentar características particulares, das coisas mais banais e concretas às mais altas criações artísticas, tem uma origem modesta.

· George Mounin reúne as definições de estilo em três grupos: 1) as que consideram estilo como desvio da norma; 2) as que julgam como elaboração; 3) as que o entendem como conotação.

· Nils Erik Enkvist as distribui em seis grupos: 1) estilo como adição; 2) estilo como escolha; 3) estilo como conjunto de características individuais; 4) estilo como desvio da norma; 5) estilo como características coletivas; 6) estilo como resultado de relações entre entidades linguísticas.

· Acrescente-se que, dos teóricos da Estilística, alguns só consideram o estilo na língua na língua literária, outros o consideram-nos diversos usos da língua; alguns relacionam o estilo ao autor, outros à obra, outros ao leitor, que reage ao texto literário; alguns se concentraram na forma da obra ou do enunciado, outros na totalidade forma-pensamento.

1.2. O APARECIMENTO DA ESTILÍSTICA

· A estilística surgiu nas primeiras décadas do século XX, graças, sobretudo a dois mestres que lideram duas correntes de grande importância: Charles Bally (1865-1947), doutrinador da estilística da língua, e Leo Spitzer (1887-1960), figura exponencial da estilística literária.

1.2.1. Estilística da língua

· Ampliando o campo de estudo do seu mestre Ferdinand de Saussure, Charles Bally volta-se para os aspectos afetivos da língua falada, da língua a serviço da vida humana, língua viva, espontânea, mas gramaticalizada, lexicalizada, e possuidora de um sistema expressivo.

· Bally distingue duas faces da linguagem: a intelectiva ou lógica e a afetiva; estuda os efeitos da afetividade no uso da língua; examina os meios pelos quais o sistema impessoal da língua é convertido na matéria viva da fala humana.

· Os efeitos expressivos, pelos quais o ser humano manifesta seus sentimentos e atua sobre o seu semelhante, são classificados em naturais e evocativos.

1.2.2. A Estilística como sociolinguística

· Entre os linguistas ingleses voltados para a Estilística, é oportuno mencionar que David Crystal e Derek Davy, que, embora não se prendam à corrente iniciada por Bally, apresentam alguns pontos comuns.

· Segundo estes autores, a Linguística é a disciplina acadêmica que estuda cientificamente a linguagem, e a Estilística é uma parte dessa disciplina que estuda certos aspectos da variação linguística.

· Os autores reconhecem que o primeiro passo na análise estilística é a apreensão dos traços estilísticos; e que é forçosamente intuitivo, mas o estilólogo deve falar objetivamente sobre eles.

1.2.3. A Estilística Literária

· É outra grande corrente da Estilística, iniciada por Leo Spitzer, também chamada idealista, psicológica e genética.

· A Estilística de Spitzer faz parte da reflexão, de cunho psicologista, sobre os desvios da linguagem em relação ao uso comum.

· O objeto da Estilística é bem amplo, global, abrangendo “o imaginativo, o afetivo e o conceitual”.

· Segundo Dâmaso Alonso Toda obra literária encerra um mistério e sua compreensão depende basicamente da intuição, podendo-se, entretanto, estudar cientificamente os elementos significativos presentes na linguagem.

· Há ainda três modos de compreender a obra literária, marcados por um crescente grau de precisão.

· O primeiro é o do leitor comum, uma intuição totalizadora, que se forma no processo da leitura e que reproduz a intuição totalizadora que deu origem à obra.

· O segundo é o do crítico, cujas qualidades de leitor são excepcionalmente desenvolvidas, tendo ele uma capacidade receptiva mais intensa e mais extensa que a comum.

· O terceiro é o da tentativa de desvendar os mistérios da criação de uma obra e dos efeitos dessa obra sobre os leitores.

· A tarefa da Estilística literária é examinar como é constituída a obra literária e considerar o prazer estético que ela provoca no leitor.

1.3. ESTILÍSTICA FUNCIONAL E ESTRUTURAL

· A Estilística se diz funcional, quando relacionada às funções da linguagem, e se desenvolve, em grande parte baseada nos estudos de Roman Jakobson.

· Rejeitando os termos Estilística e estilo, Jakobson os substitui por Poética e Função Poética, respectivamente.

· O objeto da Poética é esclarecer o que é que faz a mensagem verbal uma obra de arte; a distinção do que é artístico do que não é artístico.

· A função resultante do pendor para o emissor é a emotiva (ou expressiva), cuja realização mais pura é a interjeição.

· A função ligada ao canal é a fática, que diz respeito ao contato entre emissor e receptor.

· A função poética, que vem a ser o pendor para a própria mensagem, correspondendo à sua elaboração como um fim em si mesma, pode sobrepor-se às demais funções, ou ainda estar presente no texto sem ser a de maior proeminência.

· Aproximando a teoria de Jakobson da de Bally, podemos dizer que, enquanto para este a Estilística se concentra na função emotiva da linguagem em relação com a função intelectiva (referencial), para Jakobson a Estilística, ou Poética, se concentra na relação da Função Poética com as demais funções.

· Para explicar a realização da função poética, Jakobson entra na estruturação da frase e do texto (Estilística Estrutural), lembrando os dois modos fundamentais do comportamento verbal; a seleção (eixo paradigmático) e a combinação (eixo sintagmático).

· Jakobson mostra que o efeito poético repousa sobre uma combinação das duas estruturas: a análise da mensagem não deve dispensar a análise do sistema, o código.

· Riffaterre considera a Estilística um estudo exclusivo da mensagem, negando a pertinência estilística do sistema.

· O estilo é forma resultante da forma da mensagem e repousa sobre uma dupla série de procedimentos: uns decorrentes de uma convergência, e outros decorrentes dum contrastes de signos.

· Samuel Levin, aplicando o princípio da função poética de Jakobson, procura descrever as estruturas linguísticas que distinguem a linguagem da poesia da linguagem comum.

1.4. ESTILÍSTICA E RETÓRICA

· A Estilística despontou nas primeiras décadas deste século como uma disciplina de intenção mais ou menos científica, sem o objetivo prático de ministrar conselhos ou normas a quem fala ou escreve.

· A Retórica, que se ocupou da linguagem para fins persuasivos e artísticos.

· A acentuada valorização da palavra, do discurso, que impregna as falas dos heróis homéricos nos faz crer numa retórica assistemática.

· A Retórica é primariamente uma técnica de argumentação, mais do que de ornamentação.

· Ao tratar do estilo, afirma ser a clareza, que se alcança pelo emprego dos termos próprios.

· O orador deve adequar o estilo rasteiro como o empolado.

· Salienta também a importância do epítero e do diminutivo, aconselhando, contudo, a moderação no uso de um e outro.

· Muito pertinentes são também as considerações sobre o ritmo, o qual concorre para que o discurso ganhe majestade e realize a sua função de comover.

· Na Poética, Aristóteles trata da conceituação de poesia como imitação da realidade (mimese), dos gêneros poéticos (tragédia e epopéia, sobretudo) e da elocução poética, mencionando aspectos comuns a oratória, como clareza.

· O estudo da elocução chegará a sobrepor-se ao das demais partes da Retórica (invenção, disposição, ação e memória).

· Com a profunda mudança de idéias que se dá a partir do século XVIII (Romantismo), com a valorização do individual e repúdio de normas estabelecidas e da imitação como princípio artístico, a Retórica cai em desprestígio, passa até a ser ridicularizada.

· Por volta dos anos sessenta, pode-se presenciar um movimento de revalorização da Retórica, uma nova avaliação da sua contribuição ao estudo dos fatos da linguagem.

· Pierre Giraud, dá um balanço do seu legado: “A Retórica é a Estilística dos antigos; é uma ciência do estilo, tal como então se podia conceber uma ciência.

· É possível que esse julgamento seja excessivamente favorável, mas é inegável a importância da contribuição da Retórica para o conhecimento dos fatos da linguagem em geral e da linguagem artisticamente elaborada em particular.

· A Retórica é um conjunto de desvios suscetíveis de autocorreção, isto é, que modificam o nível normal de redundância da língua, transgredindo regras, ou inventando outras novas.

· O desvio criado por um autor é percebido pelo leitor graças a uma marca, e em seguida reduzido graças à presença de um invariante.

· O conjunto dessas operações, tanto as que se desenvolvem no ção desteprodutor como as que têm lugar no consumidor, produz um efeito estético específico, que pode ser chamado de ethos e que é o verdadeiro objeto da comunicação artística.

· A Retórica Geral toma exemplos, não são muito numerosos, quer da linguagem literária, quer da jornalística. É uma obra sobrecarregada de teoria, que exige do leitor certo tirocínio nos estudos linguísticos ou teóricos.

1.5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

· Sendo muito numerosos os autores que se ocuparam ou que se vem ocupando de Estilística e Retórica, apresentando novas idéias e teorias, e não sendo a intenção deste trabalho fazer um histórico minucioso do seu desenvolvimento.

· Pela incursão feita através das obras mais significativas da Estilística e Retórica, pode-se ver que noções fundamentais da primeira já se encontravam na segunda, como a de desvio e escolha.

· A Estilística tem um campo de estudo mais amplo que o da Retórica: não se limitando ao uso da linguagem com fins exclusivamente literários;

· As várias teorias estilísticas, cada qual com sua contribuição, podem ser compreendidas em dois grupos: as que consideram o fenômeno estilístico como objeto de pesquisa em si mesmo, e as que o consideram como o meio privilegiado de acesso à interioridade do escritor.

· O caráter científico da estilística – ou a sua pretensão de atingir o estatuto de ciência – advém do seu objetivo de explicar os usos da linguagem que ultrapassam a função puramente denotativa, com maior exatidão e sem o propósito normativo que caracterizou a Retórica.

Alessandro de O. Arantes, Maria Luiza e Maria da Conceição - Letras(NAESM/UERN)

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